Meu avô foi um homem difícil. Ele foi daqueles tipos de homens que nasceram próximos à 2° Guerra Mundial, foi treinado para ser frio, forte e formal. Casou com minha avó (porque fazia parte do roteiro daquela época se casar cedo e constituir família), construiu a casa onde moro hoje, tinha um bom emprego, era muito inteligente - mas emocionalmente, era ZERO de inteligência.
Nunca soube administrar seus próprios desafios, e acreditava que era assim mesmo, dar trela aos sentimentos era coisa de "gente vadia" (como ele mesmo dizia).
Se afogou na bebida, transformou a vida da sua família em um verdadeiro calvário. Afastou de si as próprias filhas, as netas e netos, morreu solitário em uma madrugada fria em outubro de 1996.
Não sei exatamente o motivo, mas após o seu enterro, minha família se reuniu para desmontar o quarto onde ele morreu, cada um escolheu o que queria ficar. Era uma tarde de sol, era primavera, mas tinha cara de outono. Eu tinha 10 anos, mas me lembro disso até hoje.
Lembro pouco dele, apenas de alguns eventos bem ruins, porque ele nunca se preocupou em se mostrar mais "fragilizado". Minha mãe tem lembranças terríveis dele, e por muito tempo, ficou assim mesmo.
Curiosamente, de uns tempos para cá, me peguei ouvindo Nelson Gonçalves (meu avó adorava ouvir o "Nersão", como ele o chamava, todo domingo de manha, na vitrola. Ele abria a casa toda e ouvia o disco no último volume). E ouvir o "Nersão" me fez ter um outro tipo de entendimento daquela criatura seca que foi meu avô.
Nada pode apagar as situações ruins que foram criadas, mas, de repente, esses momentos que ficam voltando na minha mente, e a vontade súbita de ouvir o que ele ouvia, começa a abrir um portal de compreensão.
O que vocês acham? Já aconteceu isso com vocês, de, do nada, começar a pensar em algum parente que já se foi, e tentar entender a cabeça dele?
Super! E não só com pessoas que já se foram, mas também com pessoas com quem ainda convivo.
Pra mim, tem a ver com TANTA coisa!
Primeiro a gente trabalha a empatia e se coloca no lugar, na pele e na vida do outro.
O que é um exercício MARA para aumentar nossa compaixão, diminuir nosso julgamento (interno e externo), trabalhar as expectativas que a gente cria em relação a nós mesmos e ao outro.
Nossa, muita coisa tá sendo trabalhada!
Praticamente uma constelação familiar!
Honrando a história daqueles que vieram antes. E entendendo que o que eles fizeram/ foram ou como eles agiram, abriu caminhos diversos para que a gente se torne quem a gente verdadeiramente é.
Que linda…
Uau Amanda. Nossa eu tô aqui sentindo tudo que escreveu. Parece que você está abrindo espaço pro perdão e pra algum tipo de libertação do seu avô, que independente das razões (que parece que foram muitas), foi mal compreendido. Ele certamente não teve tanto espaço interno pra se compreender. Estou muito grata com a tua partilha porque de alguma forma, conectei com essa história e estou enviando carinho, amor e luz pra esse masculino ferido que se expressa pela sua ancestralidade Mas com certeza, pela minha também. Seguimos juntas Conte cenas dos próximos capítulos.